domingo, 7 de novembro de 2010

A felicidade de Maria

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Maria estava feliz da vida. O bom da vida era isso, um final de semana com a família reunida, ao lado de José. Gostava de reunir toda a família para que, juntos, pudessem desfrutar do almoço de domingo exaustivamente preparado para que todos os dez parentes reunidos à mesa pudessem se fartar. Quando acontecia de faltar comida a mais para um ou outro se empanturrar, José já olhava torto para Maria, e ela sabia que mais tarde iria ter. Ter o de sempre, o que sempre tinha quando José ficava bravo ou insatisfeito com algo. Teria a surra que merecia.

Maria era uma mulher boa e calma, não gostava das brigas com José, mas não contestava. Sabia que eram todas por sua culpa. Afinal, se fizesse algo que José queria não haveria briga. Se tivesse colocado o lixo para fora na hora em que ele pediu, se deixasse o filho de três anos chorando de fome para levar a cerveja que José pedira antes que o último pênalti fosse batido, se não ligasse de ver o marido transar com a filha mais velha, de doze anos... Mas Maria era recatada demais em seus costumes e sempre terminava por discordar de José. Entretanto, pensava ela, não tinha do que reclamar do marido, era trabalhador e nunca deixava faltar comida à mesa, além do mais, tinha que dar um desconto para ele, voltava muito cansado do trabalho e as vezes um pouco irritado.

Maria só ficava triste quando cedia à algum de seus pedidos e este não lhe agradecia. Aliás, José nunca agradecia quando Maria acertava, mas quando errava ou discordava de algo, lá estava ele para dar à ela um pouco mais de disciplina.

Apesar dos pesares, Maria era feliz assim, e não achava que faltava razão ao marido para as surras diárias, sabia que era culpada pela maioria de seus dissabores. Mas agora não era hora de pensar no que teria de enfrentar mais tarde, tinha de voltar à cozinha porque a pilha de pratos ao lado da pia estava cada vez maior, e José já começara a olhar torto, aquele olhar torto de alma torta.

12 comentários:

Fiquei uns dois minutos sem ação depois de ler. Muito profundo.
O que mais me impressionou é sobre como você escreve de um ponto de vista - o da Maria - que não é nada usual.
Excelente!

http://educacaoalienista.blogspot.com

Se puder dar uma opinião mais crítica sobre meus textos, ficaria feliz!

Essa forma de viver é cada vez mais popular, a mulher não vê forças para mudar aquilo que a incomoda e pensa muitas que não poderá fugir desta situação sem sofrer alguma consequência, por isso que temos que estar sempre atentos a indícios de violência em nossa casa e aos nossos amigos e familiares.

Grande Abraço.

www.bloginoportuno.blogspot.com

Bons Ventos!!

Diferente a forma como voce escreve!Parabéns!!

impressionante... muito profundo

Apreciando uma boa leitura
parabens

http://menteilicita.blogspot.com
ja seguindo...
retribuição para uma pacifica harmonia

paz!

Ah!
Gostei! Chutando a cara do belo e mostrando a realidade. Gostei inclusive porque seu texto fala da visão da Maria machista quanto ela mesma. E eu, feminista ferrenha, apesar de me doer com isso, achei maravilhosa a idéia de propôr um texto real, que fala de muitas mulheres que se sujeitam a certos papéis e nem pensam em se rebelar.
Losterh apóia este post. rs
hahaha
Abração, Ana. Gostei!

Ótimo post, e parabéns pela forma como escreve. Interessante e bom de seguir lendo.
Sucesso, abraços

O mais triste é constatar que o texto é um choque de uma realidade nua e crua, que acontece a cada minuto no mundo, e o conformismo é sempre impera nesses momentos!
Belissima forma de escrever!

Lembrou-me bastante a música de Chico Buarque "Com açúcar, com afeto."

Achei bom, não obstante, acredito que poderia ser melhor. A temática é muito boa.

Gostei da crônica.Parabéns,não serei careta como ascka,em alguns pontos me perdi entre as linhas mas,sua escrita me agradou.