quarta-feira, 14 de setembro de 2011

As Borboletas de Margarida

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Nunca ninguém soube explicar, nem que vagamente, qual era a origem e o por que de aquelas borboletas sempre rondarem a existência de Margarida. Desde que veio ao mundo junto com uma tempestade de dezembro, as borboletas laranjas vieram junto. Primeiro, perceberam a presença delas na enfermaria, na qual deixaram a pequena Margarida à espera de ser levada para casa. Quando deram por conta daquelas borboletas surgidas de forma desconhecida dentro de uma enfermaria, no meio da madrugada, todos deram de ombro e pensaram que deviam estar ali desde antes da tempestade que desaguou naquele fim de tarde e que lá permaneceram até então, só que ninguém ainda as havia visto.

No entanto, as borboletas nunca sumiram da vida de Margarida. Quando ela foi para sua casa com seus pais, um cortejo de pequenas borboletas laranjas e amareladas seguiu o carro e entrou na garagem da casa mais que depressa. Quando os portões fecharam, as borboletas sumiram para reaparecerem depois já dentro da casa, instaladas no quarto que viria a ser da recém chegada Margarida.

Embora desde sempre achassem o fato estranho e curioso, os pais da menina nunca se preocuparam de fato com a presença daqueles insetos amigáveis e que traziam um colorido um tanto vivo ao quarto branco e rosa de sua filha. Na verdade, se acostumaram tanto com a presença dos seres coloridos que quando não as viam logo de cara por perto da filha achavam estranho e logo começavam a varrer com o olhar o chão do lugar onde haviam deixado a filha, temendo que pudessem ter morrido, como um sinal de mau presságio. Mas logo as viam em alguma quina de parede, algum móvel um pouco mais escuro no qual era difícil de serem identificadas.

Os anos foram passando e Margarida, crescendo. Seus cabelos acabaram sendo alaranjados, de um ruivo pálido e vibrante ao mesmo tempo, sempre preso em tranças. Laranjas como as borboletas que pousavam neles. A pele cálida lembrava uma boneca de porcelana e as sardas que tinha pelo rosto, logo abaixo dos olhos, pareciam pequenos desenhos de borboletas que voavam rumo aos olhos da menina. Os olhos azuis, de um azul escuro e impenetrável, no qual, por mais que se olhasse, não conseguia distinguir um átimo de pensamento ou vontade de Margarida.

Como moça bonita que era, não tardaram a lhe aparecer pretendentes. Vinham de todos os lados, de todos os tipos e com todas as intenções, boas ou más. Os que vinham com as más intenções, logo desistiam da empreitada, pois como só queriam usufruir um pouco que fosse da beleza da moça, não conseguiam aturar aquele bando de borboletas sobrevoando suas cabeças e fazendo ventar o ar perto de suas orelhas. Afinal de contas, não valia tanto assim uma transa, qualquer que fosse ela. Já os bem intencionados, embora aguentassem pacientemente as borboletas pairando sobre suas cabeças e pousando em lugares não desejados, ficavam desolados pelo desinteresse da menina. Acabavam, assim como os mau intencionados, desistindo da paixão platônica pela moça com nome de flor do campo.

Com o tempo, os pretendentes de todos os tipos passaram a ser de tipo nenhum. Viram que Margarida vivia em um mundo só dela, com suas amigas de berço sempre ao lado protegendo a ruiva que lhes dera a vida. Parecia que nem era desse mundo. Tudo o que pensava era em voar, num céu azul límpido e sem nuvens, se abrigar embaixo das folhas das árvores e contemplar a beleza do mundo. Os pais já haviam desistido de tentar faze com que se interessasse por pessoas, rapazes ou moças, com quem pudesse partilhar tanto amizades como namoros. Margarida sempre respondia irredutível às investidas dos progenitores: "Não tenho interesse."

Da mocidade fez-se a maturidade, e dela fez-se a velhice, que chegou muda e na ponta dos pés, com medo de ser notada e que lhe fugisse o corpo tão almejado no qual pudesse habitar. As sardas, antes completamente visíveis nas bochechas da agora velha senhora, estavam enrugadas, amassadas pelo tempo. As borboletas também alcançaram a velhice junto com Margarida, mas estavam tão velhas quanto ela, parecendo folhas contorcidas ao vento. Nem voavam mais, ficavam pousadas o tempo todo na poltrona em que a velha tecia guardanapos de todas as cores que tinha na caixa de costuras, com muitas borboletas desenhadas. E assim passavam os dias da velhice de Margarida.

Embora nunca houvessem lhe dado uma resposta para o caso das borboletas, Margarida tinha uma, pensada e projetada por ela mesma. Acreditava que as borboletas lhe deram a vida, por isso pudera viver tão bem. E só assim o vivera por que dedicara muito de seu tempo, senão todo ele, a ser amiga e companheira daquelas que tinham nascido com ela e estado ao seu lado em todos os momentos de sua vida. Fora fiel a quem por ela tinha feito muito. Quando contou sua teoria a alguma vizinha fofoqueira, logo começaram a falar que a senhora do 9 tinha perdido a razão, criando uma história na qual transformou em Deus as borboletas.

Margarida não ligava. Sabia que se tivesse fé em algo, como tinha em sua certeza, não importava o que dissessem, pois saberia ser verdade aquilo que sempre teve fé. Tinha fé nas borboletas, que de uma forma ou de outra coloriram seus dias, acompanharam seus passos, avisaram de sua chegada para outras pessoas e foram fiéis sempre, mesmo quando não havia mais fidelidade nesse mundo.

Numa manhã cinza do mês de julho, amanheceram todas mortas. As borboletas, murchas pelo tempo, caídas em cima do lençol branco, junto ao pé de Margarida. Essa, por sua vez, ia embora junto com as companheiras de sempre, que lhe deram vida enquanto viveram e a levaram consigo quando morreram. Fiéis como sempre.

12 comentários:

adoreei o texto :)
adorei seu blog tbm

http://thaa03.blogspot.com/

Olha, gostei muito do blog viu, as barras laterais estão impares, bem original e requintadas.
Abs

Depois de compreender esse texto me sinto na obrigação de voltar mais vezes aqui. Parabéns pelo blog ;D

Lindo texto *-*
http://want-to-go-to-there.blogspot.com/

historia mega foda eu gostei e muito

Adorei o texto mesmo. Super leve, bom de ler e lindo.
http://lollyoliver.wordpress.com/2011/09/05/fotografia/

Quero borboletas assim para mim tambem ): rs. Uma leitura muito gostosa, adorei ^^ Parabéns pelo blog.

nanda-avalon.blogspot.com

seu blog ta lindo
parabénnns!

http://www.hrdoblush.com/

apesar de longo e bastante melancolico, foi bastante expressivo e com uma mensagem que no lev a uma profunda reflexao

que fofo *-*

www.foiporquerer.blogspot.com