quarta-feira, 8 de agosto de 2012

15 dias sem ela.

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Hoje faz quinze dias que minha mãe morreu. A dor vai acalmando com o passar dos dias...lógico que a presença de pessoas mais que importantes ao nosso redor acaba nos dando mais força para seguir a caminhada. Sempre tive esperança, sempre achei que um dia, cedo ou tarde, minha mãe venceria a luta contra o câncer, terminaria de vez com essa guerra sem fim. Mas...no final das contas,  doença levou a melhor, levou minha mãe embora, pra bem longe de nossas vistas. A dor é grande, muito grande, mas o choro vai passando com o tempo, e a sensação de incredulidade, pelo menos em mim, cresce a cada dia...Parece que tudo não passou de um sonho ruim, e que no dia de amanhã quando acordar, ela vai estar por aqui, dando aquela risada gostosa, com sua presença iluminada...
Infelizmente, a morte é algo certeiro em nossas vidas...não temos como escapar dela, pelo menos isso me consola. Sei que ninguém ficará impune à dama de negro...todos acabaremos nos seus braços, cedo ou tarde, rico ou pobre, alegre ou triste...Mas o que mais dói em mim é o fato de que eu achei que ela era invencível, insuperável, inigualável....pra mim, minha mãe venceria a vida toda todos os problemas que cruzassem seu caminho...venceria sempre e seria sempre soberana...
Após 12 anos de luta contra o câncer, ela perdeu a guerra. No entanto, venceu inúmeras batalhas, além de ter provado a todos que estavam à sua volta o que é força, vontade de viver e garra. Viveu, desses 12 anos com a doença, uns oito meses um pouco mais debilitada. O resto do tempo, onze anos e pouco, viveu como se não tivesse nada. Sempre com alegria, fazendo as coisas que queria com total disposição e vigor físico. É inacreditável ver as esperanças e sonhos que tínhamos se esvaindo um a um, sem deixar a nós que tanto a amamos um alento, um conforto, um beijo de despedida.
No começo desse ano, quando ela teve uma infecção severa na boca devido a quimioterapia, achei que seria o fim. Ela ficou sem comer por cerca de um mês e meio, ingerindo só água basicamente no primeiro mês. No entanto ela venceu de novo. Foi internada mas saiu do hospital andando, com total disposição pra começar tudo de novo. Mas o destino não deu trégua...e logo em seguida ela teve que parar de tomar a quimioterapia, pelo fato de sua medula não estar aguentando mais os medicamentos, que estavam acabando com seu organismo antes que o câncer o fizesse.
Com a pausa no tratamento, o tumor avançou de uma forma inacreditável...em cerca de quatro meses, o que antes estava controlado evoluiu demais, ela emagreceu muito, perdeu toda a gordura do corpo, ficou pele e osso...e barriga, pois a doença do fígado avançada, como era o caso dela, câncer de mama metastático para fígado, acaba gerando um acúmulo de água na cavidade peritonial, na barriga, gerando um fenômeno chamado ascite. A pele com o tempo foi amarelando...mas eu sempre me apeguei aos olhos...minha mãe sempre me dizia que quando os olhos de alguém estavam amarelos já não tinha o que fazer. Então, mesmo que tudo estivesse indo contra as nossas expectativas, me apeguei aos olhos...enquanto os olhos estivessem claros, ainda brancos, tudo estaria bem. Até o dia em que comecei a notar pequenas veias vermelhas no interior dos olhos, como se fosse uma pequena irritação. Pensei, ''não, não pode ser, deve ser só uma irritação mesmo''. Mas os dias foram passando e vi que a irritação não melhorava...até que o aspecto vermelho foi passando e deixando um amarelado nos locais em que antes estavam vermelhos. Foi algo gradual, mas que um dia, quando olhei, já estava totalmente amarelo. Quando os olhos amarelaram, e eu vi que não era algo passageiro, tentei me apegar em algo que me fizesse acreditar que não estava tudo perdido...não sei em que me apeguei, mas ainda conseguia ter espeeranças. Tive esperanças até os últimos dias, quando uma diarréia acabou por deixar ela de cama quase que direto, no tempo em que ficou em casa. Um dia, então, a noite, ela ficou com sono, muito sono...começou a embaralhar as idéis, não conseguia mais falar normalmente, pois o sono não estava deixando ela articular os pensamentos...até que dormiu. Chamamos o SAMU, que veio rápido, e levou ela pro hospital. Ela ficou internada cinco dias até morrer. Nos cinco dias, dormiu sem parar, não acordou mais... a insuficiência hepática causou um acúmulo de toxinas no organismo, que acabaram por afetar o estado de vigília e a deixaram dormindo sem parar. Não sentiu dor e nem teve consciência de que o fim estava lá, logo ao lado. Pelo menos nisso Deus foi bom, deixou ela com esperança e com a certeza de que tudo estaria certo e de que tudo estava bem até o fim.
Aprendi com a minha mãe que não existe nada no mundo mais importante que o amor. O amor é o sentimento mais puro que existe...um amor verdadeiro salva o ser humano de qualquer pequenez, o dignifica. Aos que ainda podem demonstrar seu amor por quem ama, sem que seja em orações, que o façam todos os dias, tanto em palavras quanto em seus atos. Tive tempo de demonstrar o meu, ainda bem. Mesmo longe, fora de minhas vistas, minha mãe está aqui, em tudo o que me ensinou, nas conversas que tivemos, nas risadas que demos e nos choros que compartilhamos. Está aqui, viva enquanto eu viver, dentro do meu coração, como a minha amiga mais querida, minha melhor amiga, a melhor mulher, a melhor pessoa que poderia ter existido. Já não está mais aqui pela sua grandeza...o mundo é para os fracos e pobres de espírito. Que a jornada dela seja repleta de luz, que os caminhos que esteja trilhando agora estejam livres de qualquer doença e qualquer obstáculo, e que a passagem para o outro lado tenha revelado que a vida é apenas uma pequena parada frente à eternidade que nos espera.

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